quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Dedicatória a Hélio Flores e António Ervilha-de-cheiro

Lembram-se de uma bela tarde, na ainda mais bela cidade de Silves, quando alguém me recitava isto a menos de 5 centímetros de mim e a Ana Lúcia estava lá por trás a rir-se as gargalhadas da minha vontade de fugir?! Pois bem, deliciem-se!

"Eu tenho vinte e dois anos e tu às vezes fazes-me
sentir como se tivesse oitocentos
Que culpa tive eu que D. Sebastião fosse combater os
infiéis ao norte de África
só porque não podia combater a doença que lheatacava os órgãos genitais
e nunca mais voltasse?
Quase chego a pensar que é tudo mentira que o
Infante D. Henrique foi uma invenção do Walt Disney
e o Nuno Álvares Pereira uma reles imitação do Príncipe Valente!
Portugal,
Não imaginas o tesão que sinto quando ouço o hino nacional
(que os meus egrégios avós me perdoem).
Ontem estive a jogar póker com o velho do Restelo.
Anda na consulta externa do Júlio de Matos.
Deram-lhe uns electro-choques e está a recuperar
àparte o facto de agora me tentar convencer que nos
espera um futuro de rosas.
Portugal,
Um dia fechei-me no Mosteiro dos Jerónimos a ver
se contraía a febre do Império
mas a única coisa que consegui apanhar foi um resfriado.
Virei a Torre do Tombo do avesso sem lograr encontrar
uma pétala que fossedas rosas que Gil Eanes trouxe do Bojador.
Portugal,
Se tivesse dinheiro comprava um Império e dava-to!
Juro que era capaz de fazer isso só para te ver sorrir.
Portugal,
Vou contar-te uma coisa que nunca contei a ninguém
Sabes,
Estou loucamente apaixonado por ti!
Pergunto a mim mesmo
Como me pude apaixonar por um velho decrépito e idiota como tu
mas que tem o coração doce, ainda mais doce que os pastéis de Tentugal
e o corpo cheio de pontos negros para poder espremer à minha vontade.
Portugal, estás a ouvir-me?
Eu nasci em mil novecentos e cinquenta e sete,
Salazar estava no poder, nada de ressentimentos,
o meu irmão esteve na guerra
tenho amigos que emigraram, nada de ressentimentos,
um dia bebi vinagre, nada de ressentimentos.
Portugal,
depois de ter salvo inúmeras vezes os
Lusíadas a nado na piscina municipal de Braga
ía agora propôr-te um projecto eminentemente nacional:
Que fôssemos todos a Ceuta à procura do olho que
Camões lá deixou.
Portugal,
Sabes de que cor são os meus olhos?
São castanhos como os da minha mãe.
Portugal,
gostava de te beijar muito apaixonadamente
na boca."

Jorge Sousa Braga, "Portugal"

Para vocês Hélio e António. Já morro de saudades! :)